segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

A Corrida do Século-->



Nova York em polvorosa Há 100 anos, no dia 12 de fevereiro de 1908, Nova York amanheceu agitada. Uma multidão de pelo menos 250 mil pessoas se aglomerava em suas avenidas para ver os seis carros que se lançavam numa louca aventura, a disputa da Corrida do Século, com ponto final em Paris.
Até aquele dia, apenas nove carros já haviam atravessado os Estados Unidos de costa a costa, o mais rápido deles em 15 dias. Não havia estradas para automóveis, não havia postos de gasolina no caminho e era inverno. Os carros participantes não tinham aquecimento para enfrentar a neve. Também não eram cobertos e, na maioria, não tinham sequer pára-brisas.
A corrida, considerada até hoje a mais longa da história, durou seis meses e foi vencida pelo Thomas Flyer, um carro de luxo fabricado na cidade de Buffalo, estado de Nova York, inscrito pelo fabricante. Em segundo lugar ficou um Protos, carro produzido especialmente para a prova, com o apoio do imperador germânico, Kaiser Guilherme II e pilotado por oficiais do exército alemão.


Herói por acaso
Como em toda a boa história, não poderia faltar um herói. O mecânico George Schuster, convocado na véspera da largada para dar apoio ao carro americano, foi quem acabou levando o Thomas Flyer até Paris. Segundo seus próprios cálculos ele rodou no total 21.470 km, mas a viagem incluiu, também, a travessia do Oceano Pacífico por navio, de São Francisco ao Japão e outro trecho naval, dali até Vladivostok, na Rússia.
Nação contra nação - Treze carros foram inscritos para participar da prova, mas sete não apareceram para largar. Além do Thomas, único participante americano, e do alemão Protos, havia um Zust, italiano, e três franceses, um Motobloc, um DeDion e um pequeno Sizaire-Naudin, que abandonaria a corrida no primeiro dia.
As condições do início da prova foram tão duras que os abandonos começaram logo em seguida. O piloto escalado para o Thomas, Roberts Montague, deixou a equipe em Cheyene, estado de Wyoming, alegando compromissos pessoais. O repórter escalado para ir no carro pelo jornal New York Times, promotor do evento, desistiu ao chegar em Chicago, chamando a corrida de “uma insanidade”. Seu substituto, George MacAdam, iria até o final, enviando notícias diariamente por telégrafo, telefone e pombos-correio.
Dois pilotos desgnados para substituir Montague também desistiram, o último em São Francisco, onde o Thomas 41 dias após a largada, oito dias à frente do Zust. O roteiro previsto da prova previa o envio dos carros para o Alasca, de onde os organizadores acreditavam que seria possível cruzar o Estreito de Behring sobre o gelo. O excesso de neve e o derretimento dos rios no percurso alteraram os planos e o carro foi enviado de volta para Seatle para cruzar o Pacífico rumo ao Japão.

Último obstáculo:
um guarda O Thomas Flyer foi o primeiro automóvel a andar no Japão, atravessando o país antes de ser levado à Rússia. Para chegar a Paris, já no verão, os participantes tiveram que cruzar a Sibéria. No final da prova, o Protos ultrapassou os americanos e acabou chegando a Paris com três dias de vantagem. Mas, punido por ter “pulado” um total de quase cinco mil quilômetros de precurso (não passou pelo Alasca nem pelo Japão e foi transportado por trem de Idaho a Seatle), acabou tendo 30 dias somados ao seu tempo de prova, terminado em segundo lugar.
O Flyer chegou a Paris às seis horas da tarde após 169 dias na estrada e, antes de ser recebido como vencedor, enfrentou um último obstáculo: um irredutível policial que não permitia que o carro continuasse pela cidade porque não tinha faróis. A solução foi dada por um ciclista, que ofereceu a lanterna de sua bicicleta para Schuster. Como não conseguiu retirar a lanterna, o piloto amarrou a bicicleta no carro no trecho final. A chegada, apoteótica, foi acompanhada por um séquito de dezenas de automóveis e centenas de milhares de espectadores ao longo dos bulevares da capital francesa.
Aclamado como herói ao voltar para casa, Schuster teve algumas decepções. O Automóvel Clube da América não pagou o prêmio de mil dólares que havia pometido para o vencedor. Sessenta anos depois, o New York Times, numa festa comemorando o aniversáriod prova, lhe daria o dinheiro, mas sem correção monetária.
O herói tampouco recebeu os 10 mil dólares que E.R.Thomas, seu patrão, lhe prometeu pela conquista. O industrial se desculpou, alegando ter gasto mais de 100 mil dólares na prova, dinheiro que precisou tomar emprestado. Em troca, garantiu a Schuster seu emprego por toda a vida. Infelizmente, a Thomas fecharia as portas em 1912, sem conseguir capitalizar o feito de seu carro para sobreviver como fabricante de veículos. Schuster morreu em 1972, com 99 anos.

Marco histórico
Analistas apontam a Grande Corrida como a primeira grande comprovação de que o automóvel era um meio de transporte confiável para grandes distâncias. O feito do Thomas Flyer também ajudou a nascente indústria automobilística a ganhar fama mundial – antes disso, os carros europeus eram considerados universalmente superiores.
As críticas às estradas americanas também levaram a providências do governo. Em 1910 o asfalto começou a ser empregado e, em 1912, começou a construção da primeira rodovia intercontinental, ligando Nova York a São Francisco. Durante a travessia do país, no início da corrida, os participantes tiveram que aproveitar, em muitos trechos, os leitos das ferrovias, andando centenas de quilômetros sacolejando sobre os dormentes de madeira. Quem quiser ter uma idéia romantizada da prova, deve assistir ao filme “A Corrida do Século”, de 1965, estrelado por Tony Curtiss. Para quem desejar reviver o feito, evidentemente sem as agruras de outrora, a corrida terá uma re-edição com largada prevista para o dia 30 de maio.
O Thomas Flyer vencedor, preservado, está num museu de automóveis na cidade de Reno, Nevada.

Nenhum comentário: